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Obesidade infantil: assunto de todos

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No início deste ano, o relatório da Comissão pelo Fim da Obesidade Infantil, da Organização Mundial da Saúde (OMS), traduziu em números aquilo que pediatras já apontam como a principal doença infantil do mundo contemporâneo: a obesidade.

Segundo o documento (apenas em inglês), pelo menos 41 milhões de crianças de até cinco anos são obesas ou apresentam sobrepeso. A comercialização de alimentos e bebidas pouco saudáveis é apontada como um fator importante que impulsiona o problema, especialmente no mundo em desenvolvimento.

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Imagem: Creative Commons CC0

Em pouco mais de duas décadas, de 1990 a 2014, 10 milhões de crianças de até cinco anos entraram na faixa de sobrepeso, segundo o relatório. O estudo ainda alerta que, entre as doenças não transmissíveis, a obesidade é a que tem o maior potencial para reverter os avanços já obtidos em saúde e que contribuíram para o aumento da expectativa de vida da população.

Para tentar mudar essa situação, o relatório faz seis recomendações aos Governos, que vão desde orientações sobre os cuidados pré-natais até programas abrangentes que promovam a ingestão de alimentos saudáveis, seja por meio de tributação de bebidas adoçadas com açúcar, do controle da propaganda de alimentos ou da criação de ambientes escolares mais saudáveis – com normas para a merenda nas escolas – e do incentivo à prática de exercícios na educação física.

Os números do relatório da OMS dão ao problema a característica de epidemia global, o que justifica a ação efetiva dos Governos. No Brasil, o excesso de peso e a obesidade são encontrados com grande frequência, a partir dos 5 anos de idade, em todos os grupos de renda e em todas as regiões brasileiras. Os dados foram obtidos junto a mais de 188 mil pessoas pela Pesquisa de Orçamentos Familiares do IBGE que analisou a antropometria (estudo das medidas do corpo como peso e altura) e o estado nutricional de crianças, adolescentes e adultos no Brasil.

O aumento do poder aquisitivo das famílias mais pobres, nas duas últimas décadas, e o consequente crescimento do consumo de produtos industrializados (como refrigerantes, biscoitos e comidas prontas) é apontado, no documento, como um dos fatores responsáveis pelo avanço da obesidade nesta camada da população. Ademais, para quem pode gastar menos, pães e massas são mais baratos.

Imagem: Instituto Criança é Vida

Fazendo a nossa parte

Como não poderia ser diferente, os temas Saúde e Alimentação são trabalhados em três de nossos projetos: Viver Bem, Adultos e Crianças. Conhecer o próprio corpo, identificar e consumir alimentos saudáveis e em quantidades adequadas, fazer exercícios físicos, ter bom comportamento à mesa e hábitos corretos de higiene estão entre os princípios básicos que são passados para crianças e seus familiares.

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Imagem: Instituto Criança é Vida

O envolvimento da família na construção dos hábitos alimentares das crianças é fundamental.  É o que garante a nutricionista Maria Luiza Petty. Segundo ela, o primeiro passo indispensável para que a criança goste de comer alimentos saudáveis é que eles estejam presentes no consumo da família. “Frutas, verduras e legumes devem estar à mesa e serem consumidos pelos pais. Quando as crianças se habituam a ver seus pais consumindo esses alimentos, mais cedo ou mais tarde, elas começam a comer também”, afirma.

Imagem: Creative Commons CC0
Imagem: Creative Commons CC0

Outros cuidados devem ser observados na hora da refeição. “Para que a criança possa aprender com os pais, ela precisa vê-los comendo e, para isso, é fundamental que aconteçam refeições em família e que, neste momento, a TV, o celular, o tablet etc. estejam desligados”, completa a nutricionista.

 

Além de dar o exemplo, “é papel dos pais definir quais tipos de alimentos terão em casa e não esperar que a criança veja o armário lotado de doces, mas opte por comer frutas”, alerta Maria Luiza, que é mestre e doutoranda em alimentação infantil pela Universidade Federal de São Paulo – Unifesp. Segundo ela, este é o principal equívoco que os adultos costumam cometer em relação à alimentação das crianças. “Muitos pais esperam que a criança tenha consciência, responsabilidade e até maturidade para fazer escolhas alimentares adequadas, quando isto simplesmente não é possível”, explica.

Imagem: Banco de Imagens Instituto Criança é Vida
Imagem: Instituto Criança é Vida

Ainda que façam bem a lição de casa, é comum que muitos pais tenham dificuldades para tornar a alimentação dos filhos mais saudável. Para eles, a especialista dá dicas preciosas:

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Imagem: Instituto Criança é Vida

Por trás da comida

Tema central quando o assunto é a obesidade, a alimentação também pode envolver elementos que vão muito além da nutrição.  É o que afirma a psicóloga clínica, mestre em Ciências pela Universidade Federal de São Paulo e pós-graduada em Transtornos Alimentares pelo Instituto de Psiquiatria da USP, Juliana Gomes. “A comida alimenta, dá prazer, fala sobre a cultura daquela comunidade e faz a intermediação de relações sociais. A comunhão ao redor da mesa fortalece os laços afetivos e enriquece as relações”, conta.

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Imagem: Instituto Criança é Vida

Segundo ela, os pais, em geral, se sentem muito felizes em alimentar os filhos, mas podem cometer equívocos perigosos. “Quando escolhem guloseimas para satisfazer as crianças, já que passam pouco tempo juntos e não querem entrar em conflito, os pais estão optando por um caminho que poderá oferecer riscos à saúde, se repetido diariamente. A educação alimentar exige envolvimento e tempo dos pais, mas é parte fundamental da vida”, conclui Juliana.

Além de reproduzir um padrão alimentar familiar, a forma como a criança come também pode indicar outros problemas. “Comer exageradamente e rapidamente pode ser um sinal de ansiedade. As crianças podem usar o comer como uma forma de comunicar algo que elas ainda não conseguem verbalizar. Um exemplo comum é a criança que está inserida em um ambiente instável procurar na comida uma maneira de se confortar”, explica a psicóloga.

A obesidade também pode influenciar o desenvolvimento emocional da criança em função da sua aparência. Neste caso, alguns sinais no comportamento devem ser observados pelos pais. “A criança obesa que sofre bullying pode se tornar muito retraída, evitando interação social, sobretudo no ambiente escolar. Ela demonstra insegurança, pouca iniciativa e tem muito medo de se expor, fazendo de tudo para não chamar a atenção. Outras crianças reagem se tornando mais agressivas, como forma de proteger e evitar os ataques dos colegas”, conta a especialista.

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Imagem: Creative Commons CC0

Unanimidade na fala das profissionais ouvidas, tanto do ponto de vista nutricional quanto do psicológico, o envolvimento familiar é, portanto, fator determinante para o sucesso de qualquer tratamento, seja na prevenção ou no enfrentamento da obesidade infantil.